Omega 6 recupera o recorde do Centro-Oeste
Depois de mais de três meses agonizando no inverno chileno, sem voar e com problemas de saúde, finalmente consegui tirar férias, dedicadas quase exclusivamente ao vôo. Pensei muito no que fazer, sobretudo se deveria ir para o Nordeste, em busca das grandes distâncias. Mas com a velhice chegando, doente e sem disposição para grandes esperas pelo dia perfeito ou noites na roubada, decidi, por fim, ir ao bom e velho Centro-Oeste, onde aprendi a voar e onde o vôo é marcado pela abundância de dias muito bons.
Brasília passou a ser minha base no Brasil. Agora, quando vou ao Rio, de imediato, ao respirar o ar úmido saindo do avião, sinto a inquietude de uma criança a quem é negado seu brinquedo predileto, no meu caso o vôo de interior. Foram muitos os vôos inesquecíveis na temporada de 2005. Meu companheiro de iniciação no vôo livre, Rodrigo Slow, esteve comigo durante a maior parte do tempo. Não tenho dúvida de que levou uma boa impressão da "alegria goiana". As chegadas na Esplanada são as mais memoráveis, mas como temos fome de distância, relatarei, a seguir, somente o vôo mais longo, de 221 km, com decolagem em Jaraguá, e que passou a ser o novo recorde do Centro-Oeste:
Em 2003, visitei Jaraguá pela primeira vez, acompanhado do CB, idealizador do XCB, que já havia voado lá diversas vezes na época em que morava em Goiânia. Naquele ano, ainda não existia a rampa atual. Decolava-se de uma clareira bastante restrita, perto das antenas, que só permitia a decolagem com vento de frente moderado.Fiquei dois anos sem voltar, não por duvidar do potencial do lugar, mas por desânimo com a decolagem.
Finalmente, em setembro de 2005, com a nova rampa, havia uma boa razão para sair do Vale do Paranã. Logo depois de um vôo de 180 km no Paranã (12.09), fomos Slow, Vaca, Bolinha e eu para Jaraguá. No primeiro dia, voamos, respectivamente, 180 km, 145 km, 123 km e 110 km, sendo que a partir de mais ou menos 15h30 pegamos vento contra/través. O potencial do lugar foi confirmado nos primeiros 100km, em que o Slow e o Vaca voaram numa média muito rápida. Bolinha e eu capengamos na saída, e eu caí tentando pegar o bonde da frente.
O Slow, já satisfeito, entrou em modo de espera pelo dia clássico. Resolvi continuar tentanto voar longe, apesar das previsões de vento contra/través na rota. No dia seguinte, voei 150km (pouso depois de Córrego do Ouro), dos quais 60 foram feitos com vento contra/través. Enquanto uma frente estacionada fazia chover em todo o Sudeste brasileiro, a condição continuava muito boa em Jaraguá, mas a previsão indicava vento contra na rota. Tiramos alguns dias menos clássicos para descansar.
No domingo, 18 de setembro, o vento deixou de girar ao longo rota, mas era de norte/noroeste (rota para x$%*z!~). Minha experiência de Brasília me dizia que, além de muito boa, a condição de norte-noroca (frente encostando) está associada a vento forte e, conseqüentemente, boas velocidades médias. De fato, o vento na rampa era forte e tomei um lindo "pedala robinho" na primeira tentativa de saída. Na segunda, saí subindo reto e engatando sozinho no miolo de 5,5m/s para chegar à base por volta de meio-dia, com a rota à minha frente já toda formada. É provável que tenha sido um erro não haver saído mais cedo.
Já sabia que o norte/noroca ia querer me empurrar para x$%*z!~ e comecei a forçar a rota para sudoeste no intuito de evitar a cidade. Pelo rádio, veio a sugestão, devidamente ignorada, de ir voando para a cachoeira em Pirenópolis (e abandonar o vôo). Mesmo sem tocar no caudal, voei os primeiros 50km muito rápido, quase sem enroscar. O excesso de confiança me deixou no chão em Inhumas, onde salvei o dia num dust que varria um canavial. Saindo de Inhumas, não conseguia encontrar o miolo das térmicas (provavelmente porque eram dusts bastante turbulentos) e tive de me concentrar em não aterrissar, o que levou por água abaixo meu plano de voar sentido sudoeste. Baixo, sem poder tirar, fiquei à mercê da deriva de noroeste, que me levou de volta à rota que queria evitar. Já nos subúrbios de x$%*z!~, acatei o fato de que teria de voar sobre a cidade.
No que foi o momento mais memorável do vôo, catei um canhão sobre a selva de pedra, subindo à base preta, carregada. Com medo de entubar, acelerei para atravessar a cidade e continuei o vôo sobre a BR que desce sentido sul. Já bem mais baixo e arrependido de não ter usado melhor a nuvem preta da cidade, engatei na melhor térmica do dia subindo a 8,5m/s constantes e ciente de que com aquela ascendente as chances do recorde eram cada vez maiores.
No caminho para a base, me dei conta de que os cumulus já eram congestus e, olhando para trás, verifiquei que toda a rota que havia feito estava sombreada pelo desenvolvimento excessivo das nuvens. Determinado a não voar por baixo da craca que me fez subir a 8,5m/s, tirei reto pela borda, adiantando bem o vôo.
Às 15h45, já tinha coberto cerca de 160 km. Continuei voando sentido sul, com bom vento e sem roubada. A última base foi com 195 km voados. Estiquei a tirada final ao máximo, catando o "piriri" final com 205 km. Pousei pouco depois de Morrinhos, na margem da BR 153, com 221km voados. :-)
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