Tuesday, June 19, 2007

Liga Espanhola - Castejón de Sos

A segunda etapa da Liga Espanhola ocorreu em Castejón de Sos, nos Pirineus, num lindo vale de Aragón, não muito longe da fronteira com a Catalunha. A previsão do tempo era ruim para todo o campeonato, mas acabamos voando 3 provas (uma delas cancelada após uma hora da abertura do start).

A primeira prova se desenvolve em condições um pouco carregadas. Quase não há sol, mas a instabilidade gera ascendentes, que são fracas perto da montanha e mais consistentes no vale. Há nuvens grandes e, voltando da primeira baliza, voamos em chuva. O Rafa, que viaja comigo para esta competição e o British Open, lidera a volta da primeira baliza. O primeiro pelotão faz a segunda baliza pouco depois dele. Uns poucos pilotos, entre eles o Rafa, decidem voar diretamente à terceira baliza, que fica no vale. O grupo que usa a rota da montanha, e no qual estou, se atrasa.

Vôo agora um Omega 7 28, que ganhei de um amigo em troca do meu 26 (depois de Pegalajar decidi deixar de voar velas muito pequenas). Voar uma vela grande me permite enroscar nas térmicas fracas. Acabou o drama - ou assim o espero! - do XCeará e do Campeonato da Espanha, em que nunca pude salvar-me quando me encontrava baixo.

Faço a terceira baliza atrasado. Já há pilotos chegando à quarta (também no vale), entre eles o Rafa. Cato uma bomba no caminho para a quarta e penúltima baliza. O vale parece estar funcionando bem e tenho a impressão de que vou tomar um "couro" dos pilotos da frente. Rumo à última baliza, já não vejo mais vários deles. O vale se desliga num entre-ciclo e cai o primeiro pelotão sem que eu o perceba. Passo alto pelo segundo grupo, que luta na montanha para subir. Decido, então, seguir pelo vale, que acaba funcionado bem. Tenho um Icepeak pouco mais atrás e catamos a última térmica do dia. Sem saber que a última baliza está num ponto alto, dispenso o Icepeak (seria a única vela a chegar ao gol) antes de chegar à base. Faço a última baliza muito baixo e, para voltar ao gol, me meto num buraco horrível, um venturi com duas paredes opostas, de cerca de 300m cada, separadas por menos de 800m. Agora, só quero pousar bem. Chegar ao gol não será possível. Pouso a 1km da chegada. O Icepeak passa baixo mas completa a prova.

A segunda prova acontece no que seria o melhor dia da competição. A primeira baliza deixa uns tantos pilotos baixos no vale. Um deles reclama do forte vento oeste à baixa altura. Sem consultar os demais pilotos da comissão de segurança, a organização cancela (erradamente) a prova às 14h20. Somos obrigados a pousar em Villaller. O Rafa, que lidera boa parte da prova e está entre os primeiros, se retira da competição em protesto (sem ouvir o aviso da organização pelo rádio, segue sozinho até o gol). Vários outros pilotos questionam a decisão de cancelar o dia. No momento do cancelamento, estou na base da nuvem mas em décimo-primeiro. Como a prova só vale 200 pontos, o prejuízo é pequeno.

No sábado, que seria o último dia (no domingo choveu), definem uma corrida ao gol em Sort (Catalunha), de 50km e com start simultâneo. É a mesma prova do dia anterior, mas sem balizas. O dia está carregado, e o vento é forte. A organização quase erra novamente ao tentar atrasar o start. Mas os pilotos fazem pressão, e decolamos às 13h40.

Ao decolar, percebo que minha barra do acelerador estourou. No desespero, improviso um nó que me permite acelerar de forma completamente assimétrica, o que termina por estourar a costura que conecta uma das roldanas do acelerador ao tirante direito. Sem recurso ao acelerador, penso se devo seguir ou não. Na rota ao gol, há vários vales que dificilmente poderei cruzar em velocidade de trim. Decido que o mais prudente é voar reto ao gol, um pouco distante do relevo, para poder escapar dos venturis dos vales.

Para minha sorte, a estratégia funciona. Mesmo voando lento e conservador, assumo a liderança, já que os pilotos que escolhem a linha do relevo são empurrados para fora da rota e têm muita dificuldade para sair do efeito venturi. Finalmente, depois de tanto tempo, estou voando num céu repleto de nuvens, como aprendi no Brasil. Não posso acelerar, e me concentro em escolher as melhores linhas. Alguns momentos são angustiantes, pois afundo sem poder acelerar. Os pilotos que me seguem já estão me alcançando. Dois outros me passam por baixo rastejando pelo relevo. A 12 km do gol, na base, estou em posição privilegiada para matar a prova. Mas sem acelerador não há como. Chego ao gol em quarto, 2 minutos depois do primeiro, o que é suficiente para vencer a competição.

Tirei duas lições deste campeonato: A primeira é a de que - nas palavras de Andy Hediger - "no hay que abandonar". É preciso lutar até o fim. Quando perdi o acelerador, minha primera reação foi desistir. O vôo é um esporte mental, e minha maior dificuldade é a tendência a desesperar-me quando as coisas não vão como espero. A segunda lição é a de que - exceto para os pilotos que já aprenderam a não errar e atingiram um nível alto de consistência (o que não é o meu caso) - há bons e maus momentos. Os pilotos mais felizes são aqueles que conseguem passar pelos bons e maus momentos sem muita oscilação emocional. Ou seja, aqueles que aceitam as derrotas como algo natural e, ao mesmo tempo, são capazes de controlar a euforia da vitória. No dia em que eu aprender isto, acho que poderei voar melhor.

Resultados em http://www.parapentepirineos.com/images/stories/general%20fai.pdf